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segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Programação Preparatória ao Colóquio Blanchot que acontecerá em Belém, 28, 29, 30 de março.

Quando estou só, não sou eu que estou aí e não é de ti que fico longe, nem dos outros, nem do mundo. Não sou o indiví­duo a quem aconteceria essa impressão de solidão, esse senti­mento dos meus limites, esse tédio de ser eu mesmo.
Quando estou só, não estou aí. Isso não significa um estado psicológico, indicando o desaparecimento, a supressão desse direito de sentir o que sinto a partir de mim mesmo.
Não é que eu seja um pouco menos eu mesmo, é o que existe "atrás do eu", o que o eu dissimula para ser em si.

Quando sou, ao nível do mundo, aí onde são também as coisas e os seres, o ser está profundamente dissimulado.

Essa dissimulação pode tornar-se trabalho, negação. "Eu sou" (no mundo) tende a significar que somente sou se posso separar-me do ser: negamos o ser — ou, para esclarecê-lo por um caso particular, negamos, transformamos a natureza — e, nessa negação que é o trabalho e que é o tempo, os seres realizam-se e os homens erguem-se na liberdade do "Eu sou".

O que me faz eu é essa decisão de ser quando separado do ser, o ser sem ser, o ser isso que nada deve ao ser, que recebe seu poder da recusa de ser, o absolutamente "desnaturado", o ab­solutamente separado, isto é, o absolutamente absoluto.

Esse poder pelo qual me afirmo renegando o ser é real, entretanto, na comunidade de todos, no movimento comum do trabalho e do trabalho do tempo.

"Eu sou", como decisão de ser sem ser, só tem verdade porque essa decisão é minha a par­tir de todos, porque se concretiza no movimento que ela possi­bilita e torna real: essa realidade é sempre histórica, é o mundo que é sempre realização do mundo.

Eu sou o que não é, aquele que cometeu secessão, o sepa­rado, ou ainda, como se disse, aquele em quem o ser é discu­tido.

Os homens afirmam-se pelo poder de não ser: assim agem, falam, compreendem, sempre outros que não são eles e que es­capam ao ser por um desafio, um risco, uma luta que vai até à morte e que é história.

Foi o que Hegel mostrou. "Com a morte começa a vida do espírito." Quando a morte se torna poder, co­meça o homem, e esse começo diz que, para que exista o mun­do, para que haja seres, é necessário que o ser falte.

Maurice Blanchot | O Espaço Literário (1986)

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