Velhos homens devem ser exploradores, não importa onde...
Temos de estar sempre nos movendo na direção de uma nova
intensidade, de uma
união a mais, de uma comunhão mais profunda...
Nos movendo através de uma desolação escura, fria e vazia: O
grito das ondas, o
grito do vento, as águas imensas das gaivotas e dos golfinhos:
No meu fim está o
meu inicio (T. S. ELIOT).
Não há espaço, sem tempo. Não há tal coisa como espaço em branco. Sempre
se poderá imaginar a vinda – a chegada. Que alguma coisa ainda deve acontecer.
Dois homens, um romancista e um poeta, estabelecem um passível jogo. Que
estejam tensos, pois o tempo constitui a tensão. Espaço-tempo se dividindo em
dois. A respiração, realizada de volta entre um e outro, fala em tempo de
silêncio, em espaço de silêncio – a literatura. Um dos homens atende à porta. Olha
para baixo. A cabeça inclinada para o chão como um guardião na sala da
hospedaria do Castelo. Apenas que
aqui ele não está num retrato. Observada, a imagem não o confirma numa
morfologia para os olhos que se tornará o demônio de uma longa época. Certo
estrabismo a certa semiótica da reflexividade. Ele se desprende da foto, sem no
entanto avançar no espaço. O outro não questiona a importância de ficar ali
parado, uma vez que também está parado e recolhido em si. Sem rasgar a ilusão
de espaço, na distância limite de um saltar para o outro, apertarem-se as mãos:
se dá o duplo desvio. As mãos estendidas em silêncio criam lacunas, desprendem-se,
desvanecem. Eles que sempre estiveram além dos horizontes da aparência. Agora, face
a face, não têm como pronunciar um discurso de circunstância e lançar âncora
entre os musgos. Um rastreou o outro, é verdade, mas sem nunca o mapear. Leu o
livro “Thomas, o Obscuro” quando ainda escrevia seu segundo livro, e entregava-se
definitivamente à feitiçaria do poema. O outro nunca o avistou. Este poderia
ser o cenário tardio entre os dois homens. A respiração sempre foi o maior
problema para eles. Passeando a vida, o fim à vista. Para eles o desastre cuida
de tudo. E o rápido sorriso corajoso não bastaria. A aquiescência da cabeça. O
olhar. Tudo isso assusta o inferno dentro deles. Por certo, ele deveria ter gostado
de ler com minúcia e atenção insuperáveis o “Anti-Retrato” ou mesmo o “Caminho
de Marahu”. A escritura do desterro que tanto o agradava. E teria visto Kafka e
Paul Celan, em alguns versos. Os signos da solidão. A experiência do
desmoronamento. A falta vivente do ser. Não teria sido exatamente isto a
escritura desse outro que, alheio, estranho, lhe bate à porta, num fim de
outono? O que seria o mesmo que dizer: desde que entrara para a poesia? Um
homem de uma terra desfalecente, onde a vida e a cultura não passam de uma
quimera? Onde o poema, justamente depois de um amplo movimento internacional de
três poetas, passou a valer menos que qualquer slogan publicitário. Fora do mercado, ter que ganhar a vida –
trocar, vender, perder, dar, recuperar, perder outra vez. Amores. Alegrias
insensatas. As grandes dores. Um homem impelido a dar seus passos em direção ao
ócio e ao silêncio. Para quem a amizade pela poesia não se estrutura em ter que
percorrer o mesmo caminho. Amizade é mudar o caminho. Errá-lo. Não entrar na
geração. Surpreendê-la pelos flancos. O Inesperado. Não esperar que se confirme
a Revelação. E como aquelas doze baladas a que Nietzsche se refere que contamos
sempre errado. Não há o encontro marcado, sequer conosco mesmo... “Mas como eu,
ele foi parecido comigo”. De onde poderá ter ecoado isto?
Ney Ferraz Paiva, 20 de
fevereiro 2013.
Imagem: Jacob Bijani
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